O tão anunciado fim do martírio do brasileiro com os call centers deve chegar -ao menos oficialmente- à 0h de hoje, quando passam a valer as novas regras do decreto federal 6.523, que incluem os setores de telecomunicações, sistema financeiro, aviação, água, energia elétrica, transporte terrestre e planos de saúde.
O consumidor que ligar para o SAC (serviço de atendimento ao consumidor) dessas empresas neste exato momento já pode exigir o direito de falar com um atendente (e não com uma máquina) em até 60 segundos, além de ter a opção de cancelamento do serviço no menu inicial. Além disso, não poderá ouvir, nem mais uma vez, que a "sua ligação estará sendo transferida para outro atendente".
Anunciado em julho pelo governo, o decreto causou polêmica entre os setores afetados e o Ministério da Justiça. Os primeiros diziam que os 120 dias dados para as empresas se adequarem eram irreais; o segundo, que seria "implacável" no cumprimento.
Anunciado em julho pelo governo, o decreto causou polêmica entre os setores afetados e o Ministério da Justiça. Os primeiros diziam que os 120 dias dados para as empresas se adequarem eram irreais; o segundo, que seria "implacável" no cumprimento.
Três meses depois do decreto (e um mês e meio após a portaria do Ministério da Justiça, que fixou em um minuto o tempo máximo de espera por atendimento no SAC), a Folha perguntou a dez dos maiores fornecedores em áreas analisadas pelo Procon se estariam 100% adequados às novas regras sobre call centers a partir de hoje. Todas afirmaram que sim.
Mas a maioria deixou as mudanças para a última hora. Entre quinta e sexta, a Folha contatou os call centers dos setores com mais reclamações, segundo o Procon-SP, e constatou: ainda estavam em desacordo com a regra, com menus com até dez opções eletrônicas e nenhuma para falar com um atendente.
No SAC da TIM, o atendimento começava com nove opções eletrônicas, sendo a última a de falar com um atendente, e sem opção direta de cancelamento. E ainda avisava: "O tempo de espera é de, no mínimo, cinco minutos". Já na Telefônica, após minutos de mensagens comerciais gravadas, veio uma série de opções -só após quatro botões e cinco minutos de espera, vem o atendente, pedindo dados, antes de saber qual é o problema.
Na NET, o menu começava com nove opções; tecla-se nove para falar com o atendente e ouve-se que todos estão ocupados e que, para ficar na fila, deve-se apertar três. É quando começa a musiquinha com anúncios. Só após três minutos, a voz ao vivo apareceu.
E até no SAC da TAM, que afirmou que "todas as tarefas foram completadas antes do prazo", o cliente levava mais de cinco minutos até falar com o atendente. Mas a Gol surpreendeu: a espera por um atendente superou 15 minutos.
Apesar da demora, todas as empresas enviaram notas afirmando que tomariam todas as providências para se adequar em tempo ao decreto (leia ao lado). Mas consultores da área dizem ser consenso que a adequação total pode demorar.
"A probabilidade [de a regra funcionar hoje] é complicada", afirma Stan Braz, diretor da Associação Brasileira das Relações Empresa Cliente. "Isso vem justamente no pico do pré-Natal, quando as pessoas fazem compras com o 13º salário e ligam para falar do produto." E essa é a época de contratações temporárias de operadores inexperientes.
"Sentimos falta de uma uniformização de interpretação do decreto, o que só tende a acontecer quando o governo soltar cartilhas técnicas", disse Cláudio Tartarini, assessor jurídico da ABT (Associação Brasileira de Telesserviços).
Auditores do Procon-SP visitaram empresas atrás das mudanças e concluíram que elas não estão adaptadas. A NET registrou 60% de inadequação, e a Telefônica, 30%. "Os dados colhidos nos deixam preocupados com essas empresas", diz Roberto Pfeiffer, diretor-executivo do Procon.
O governo diz que não vai ceder. Ricardo Morishita, do DPDC (Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor), do Ministério da Justiça, avisa: fiscais de todo o país foram treinados para fazer respeitar a norma.